domingo, 15 de abril de 2012

Entre Irmãos

ou contos eróticos entre anormais

A cara de um era quase o espelho do outro.
Um espelho diferente em género apenas.
Quando se tocaram tremeram de vergonha como só os corpos virgens tremem.
Coraram como as crianças que deixariam de ser.
Suavemente começaram a percorrer o trilho de pelos que se eriçavam à passagem do que pensavam chamar-se amor.
Nunca se olharam nos olhos enquanto conheciam o corpo que agora lhes pertencia.
Seria como olhar para dentro.
Conheceram-se com dedos ansiosos e lábios entreabertos de prazer de crianças.
De repente algo estranho aconteceu no corpo dele que o fez esconder-se no peito dela.
Ela acalmou-o, é como nos filmes, disse.
E ele preencheu todo o seu corpo como se o tivesse feito desde sempre.
Gemeram e sussurraram como se tivessem alguma vez tido um segredo.
Horas depois de adormecerem de mãos dadas, ela soube que nunca mais seria uma só.
Gémeos, disse-lhe ao ouvido.
Ele sorriu e fechou-se sobre o umbigo dela.
Era natural, já os seus pais o tinham feito.


sábado, 14 de abril de 2012

Já gastei as palavras.
Acusas-me de um silêncio que eu nunca fui capaz de descobrir entre nós.
Nem de noite, quando a casa dorme e de olhos fechados procuro os teus pés.
Adoro que saibas, sabes?
Ultrapassámos o silêncio quando escrevemos amor pelas paredes e nos espelhos.
Fala comigo, pedes-me.
Mas porque hei-de falar se sabes o meu corpo de cor, o meu cheiro?
Porque hei-de falar se em cada beijo sabemos tudo?
- Porque preciso, foda-se.
Já gastei as palavras, meu amor.

Quem tem medo de Virgina Woolf?

Doía-lhe já o braço de tanto usar o chicote.
Se a mão lhe pesava tantas vezes em forma de palavras, humilhação e ridicularização, era a sua frustração que tentava embalar.
Batia-lhe.
E quanto menos ele se queixava, mais o cheiro a ódio a enlouquecia até salivar.
Curvava-o.
E o sangue que lhe via escorrer, era na sua pele que ardia.
O amor já só se chorava em olhos embaciados por uma velhice de hábitos e gin.
Tantas vezes as grandes cenas da vida são passadas dentro de caixinhas pequeninas, que só por vezes se vêem.
Porque é que não parava de o maltratar?
Porque ele era o único capaz de aguentar.
Sempre o amou.